data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Agência Brasil
Nunca antes na história recente do Brasil, os mundos político e jurídico estiveram tão conectados. Após o ministro Edson Fachin, do STF, ter anulado todas as condenações do ex-presidente Lula no âmbito da Lava-Jato (leia ao lado), o petista voltou a estar em condições de disputar um pleito, já que ao ter os de volta os direitos políticos, ele se torna elegível. Para lulistas, petistas e integrantes da esquerda, o que já parecia ser a tempestade perfeita, ficou ainda melhor. Isso porque o ministro Gilmar Mendes, do Supremo, decidiu levar ontem para a Segunda Turma da Corte o habeas corpus da defesa de Lula sobre a suspeição do ex-juiz federal Sergio Moro.
Ainda assim, os ministros começaram a decidir se Moro agiu com parcialidade ao condenar Lula no caso do triplex do Guarujá, investigação capitaneada pela força-tarefa originária do que Gilmar Mendes chamou ironicamente de "República de Curitiba". A votação foi pautada por Gilmar Mendes, considerado no passado algoz do PT, e, agora, elevado por críticos à condição de "anti-lavajatista".
Ao longo de uma sessão remota, que não teve fim na tarde de ontem, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski votaram pela declaração de parcialidade de Moro. O caso não teve desfecho porque o ministro Nunes Marques pediu vista (mais tempo para analisar o processo), o que adiou a conclusão do julgamento na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). Assim, o placar ficou em dois a dois.
COMO FOI
Gilmar Mendes elevou o tom ao modus operandi da Lava-Jato a Moro e aos procuradores do MPF. Segundo ele, o Judiciário ficará marcado pelo "experimento de um projeto populista de poder político":
- A Justiça Federal está vivendo uma imensa crise a partir deste fenômeno de Curitiba, que se nacionalizou.
No voto, que foi o mais longo, ele se declarou "insuspeito", até porque, afirmou, não chegou à Corte pelas mãos de ex-presidentes petistas. Logo, não tem "simpatia" ou "envolvimento com o PT".
Também pediu que o ex-juiz "seja condenado ao pagamento das custas do processamento penal nas formas da lei". Na sequência, isso foi endossado pelo ministro Ricardo Lewandowski.
Caso a suspeição seja reconhecida, ficariam anuladas as provas que já foram colhidas no processo contra o ex-presidente Lula na 13ª Vara Federal de Curitiba e, assim, as investigações deveriam recomeçar do zero. Se isso ocorrer, todas as decisões da Lava-Jato em Curitiba serão anuladas.
Para advogados, Edson Fachin expôs vícios de origem na condução processual
Para Rafael Maffini, advogado e professor de Direito Administrativo na UFRGS, a decisão de Fachin corrige o problema de competência (ao tirar da Justiça de Curitiba e ao levar para a Justiça Federal de Brasília) e, ainda, permite que sejam mantidos os atos processuais já realizados pela 13ª Vara Federal, que tinha Sergio Moro como titular. Neste sentido, a manifestação estabelece que deve "o juízo competente decidir acerca da possibilidade da convalidação dos atos instrutórios".
- Já faz um bom tempo que o STF, em casos bem semelhantes ao do ex-presidente Lula, vem reconhecendo a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba, justamente por inexistir, na legislação brasileira, regras de competência que justifiquem a tramitação de processos sobre fatos que não foram lá praticados, tampouco tenham conexão, no sentido técnico, com os fatos lá apurados. O ministro Fachin, agora, entendeu que essa mesma situação era aplicável a Lula - pontua Maffini.
Além disso, o advogado enfatiza que técnica e juridicamente a decisão de Fachin é irretocável. Ele agrega que também se acaba com um entendimento de que "a Vara Federal de Curitiba era uma espécie de juízo penal universal".
ANULAÇÃO
No entendimento do advogado Marcelo Peruchin, professor da PUC-RS e pós-doutor em Direito Penal, a decisão do ministro Fachin "causou surpresa geral". Segundo ele, o que chamou a atenção foi a abrangência da decisão, uma vez que ela trouxe a anulação das condenações do ex-presidente.
Ainda assim, Peruchin atenta para o que ele entende ser o maior revés deste caso até aqui: a suspeição do ex-juiz Sergio Moro nos julgamentos da Lava-Jato contra Lula. Ou seja, se isso acontecer, a defesa do petista terá conseguido que a Justiça reconheça que o ex-juiz não foi imparcial nos processos e que, por isso, as condenações contra Lula deveriam ser anuladas.
- Se for evidenciado que o ex-juiz agiu desprovido de imparcialidade, toda prova (da JF de Curitiba) ficaria invalidada, seria anulada. Seria um duro golpe à Lava-Jato, que depois do vazamento de áudios trouxe um ambiente diferente no Supremo, que passou a rever algumas decisões - diz Peruchin.